sexta-feira, fevereiro 06, 2009

O mundo cão e a filosofia do cotidiano


Quem acampanha esse blog já percebeu que muito de minhas reflexões são feitas a partir de situações cotidianas. É do meu entorno diário que busco matéria-priam pra meu fazer pedagógico e literário. Não podia ser diferente neste post.
Já falei noutras publicações como aprendi muita coisa, em bate papos informais, com eletrecistas, encanadores, pedreiros,mecânicos, quando precisei de seus serviços, pois embora a maioria sequer tivesse o ensino médio, tinham uma rica experiência de vida. É a famosa escola da vida que não dá diploma a ninguém, mas uma aprendizagem eficiente para quem sabe tirar lições de suas experiências individuais e coletivas.
Sei que devemos valorizar o ensino acadêmico, mas a aprendizagem cotidiana também não deve ser desmerecida, tanrto pelo cidadõa comum como por recrutadores de Recursos Humanos. O fato de ter ou não um "canudo", um diploma universitário, por si só, não deve ser mérito nem demérito de ninguém. Conheço analfabetos que têm um conhecimento empírico fantástico, assim como pós-graduados que sabem muito, mas apenas aquilo que os interessa e nada mais... Nem 8 nem 80, logicamente...
Ontem, assistindo a entrevista do capitão da Brigada Militar (polícia militar do RS), a respeito dos procedimentos que devem ser adotados diante de um ataque de cão feroz (coisa corriqueira ultimamente e infelizmente), que dilacerou parte da orelha de uma criança que passava perto de um portão de grades, tanto a apresentadora como eu, e provavelmente muitos telespectadores se surpreenderam com uma frase filosoficamente atual. Disse o capitão que "Cachorro deve ser tratado como cachorro".
Parece o óbvio ululante, mas na sociedade moderna, em que os valores estão invertidos, esse conselho do policial, que vivencia essa realidade, é um profundo ensinamento, que devemos refletir melhor sobre esse "Mundo Cão" em que vivemos.
De fato, muitos donos de cães, sejam eles inofensivos ou verdadeiras armas de guerra, tratam muitas vezes o animal, como se fosse um ser humano, uma "pessoa" da família - o que não é de se surpreender, pois até ex-ministro do Trabalho (lembram?), chegou a dizer a repórteres que cão também é gente, referindo-se as mordomias que seu cãozinho possuía; sem falar que recentemente saiu denúncia (link abaixo) de que gato (isso mesmo!) recebia o benefício da bolsa-família, por ter sido cadastrado por servidor público de um município brasileiro... Seria o Gato-de-Botas?

Gato no bolsa-família do MS

Então, tratar "cachorro como se fosse cachorro", deveria ser um conselho estendido às demais personagens sociais: gente como gente, macaco como macaco, vaca como vaca, parafraseando a música do cantor e humorista cearense Falcão...
Tem gente que dá mais regalias aos animais do que aos filhos; pior, uns preferem ter bichos e tratá-los como quase gente do que adotar uma criança... Cães e gatos de alguns chegam a ter tratamento VIP, que a maioria da população brasileira, humana, diga-se de passagem, jamais terá...
Mas, deixando a questão dos animais de lado, cabe lembrar isso a alguns universitários e formandos, em específico, àqueles formandos do Paraná, que invadiram um hospital para um trote de formatura, muitos deles portando garrafas de bebida, soltando foguetes nos corredores e pondo em pânico os pacientes, que gente humilde também é gente... E mais recentemente, os "bixos" (aprovados no vestibular de Direito!!!) de uma universidade paulista, que agrediram um morador de rua indefeso, raspando seu cabelo, sobrancelhas, numa brutalidade incompreensível e inaceitável para quem pretende ser futuros "defensores" das leis. Que futuro poderão nos dar médicos que levam pânico a hospitais e futuros advogados que atacam indefesos???
Na maioria dos casos há dois componentes nítidos envolvidos: preconceito e ingestão de bebida alcóolica ou algo mais... Talvez o álcool ou outra substância façam aflorar esse preconceito que jovens de classes abastadas tem contra pessoas fragilizadas do ponto de vista social, e os façam tratar como se animais fossem; como se animais merecessem receber esse tratamento desumano!!! É apenas uma suposição!
Não vejo nenhum desses "pittboys" ou assemelhados, invadirem shopping ou condomínios, para promover essas atitudes que seriam apropriadas a animais descontrolados. Nem entrarem em jaulas de feras de verdade para provarem alguma coisa que valha... Argh.
Por isso, importante lembrar o conselho do capitão, de que "Cachorro deve ser tratado como cachorro", e penso mais, partindo do princípio de que cão, gato, papagaio, peixinho de aquário ou o que for, deveriam ter nomes de bicho e não de gente. Não ouço mais donos chamarem seus cães e gatos de Rex, Mimi, Xuxu, etc. Muitos chamam por nomes pessoais, que nem vou citar exemplos, mas todos devem conhecer alguém que assim se comporte...
E se gente deve ser tratada como gente, dou meu conselho aos pais e/ou responsáveis: "Tratem suas crianças como crianças e não como adultos em miniatura!" Sei que isso é mais complexo, pois as crianças de hoje se autoregulam e querem ser independente cada vez mais precocemente. Escolhem suas roupas, materiais escolares, brinquedos, tudo enfim... Por um lado é interessante exercitarem o poder de escolha; por outro, escolhem apenas uma marca, um adesivo de seus desenhos e ídolos, que só por causa daquela figura (a marca, a grife), custam no mínimo o dobro de produto similar ou "genérico".
Mas essa atitude de inversão de valores não é recente, pois, conforme relatei em artigo de opinião, publicado tempos atrás neste blog, intitulado "Entre a Ética e o Corporativismo" (e que semana passada, ao pesquisar na internet, descobri que o mesmo fora usado em prova de concurso), o famoso jurista Sobral Pinto, durante o Estado Novo, para defender um preso político das bárbaras torturas e maus tratados submetidos nos porões da ditadura, alegou em sua defesa a Lei de Proteção aos Animais, já que a Lei dos Homens não o amparava. Foi algo surpreendente e comovente do ponto de vista jurídico, histórico e humanista...
Então, que cães e bichos em geral sejam tratados como tais, e que as pessoas também não percam o foco nem abusem de seu semelhante; embora saibamos de antemão que se a lei é igual para todos, no papel, na realidade, há sensíveis distorções, em que por conta de uma "ética corporativista" alguns parecem ser mais iguais do que outros...
Que fique claro que não tenho nada contra os animais-animais mesmo, que são importante como companhia de seres humanos, desde que tratados tão-somente como "bichos de estimação" e não como gente como a gente! Já tive, quando garoto, muitos cães e gatos. Desde que saí de São José do Norte (extremo sul do RS), quando tinha 18 anos, sempre morando em casas, pra residir em Rio Grande, daí em diante sempre em apartamento, perdi o contato direto com bichos, salvo uma vez que tive um casal de canários belgas (Zazu e Sininho, alusão a personagens da Disney e não a nomes de pessoas).
Atualmente, o único bichinho de estimação que vivo diariamente conectado é o "mouse" (o rato) de meu computador. Risos.
Por fim, fica aqui um conselho para animais racionais e irracionais: "Deem mais valor aos filósofos do cotidiano e menos aos (de)formadores de opinião!"

Observação: Para ilustrar e provocar a reflexão, queria colocar um videoclip da canção "Rock da cachorra", de Duardo Dusek, bem apropriada ao post, que tem versos como "Troque seu cachorro por uma criança pobre". Infelizmente não achei no YouTube. Então, ilustro o post com a imagem acima, extraída da internet, do endereço abaixo
http://reddittsurf.bravehost.com/animais.html