quarta-feira, julho 09, 2008

O "Apólogo dos dois escudos": educação e tecnologia?


Palavra puxa palavra, idéias puxam idéias, áreas do conhecimento diversas têm sempre alguma coisa em comum, além de suas diferenças. Mundos distantes podem ter a sua intersecção. Considero-me de longa data um profissional multifuncional, acumulando às vezes cargos e atividades diversas e simultâneas (pena que o salário nem sempre acompanhe progressivamente tais situações. Risos). Sempre fui muito curioso e interessado em tudo um pouco. Nem sempre com o intuito de utilizar no cotidiano. Entretanto, sempre acabo encontrando um novo olhar sobre um novo horizonte.
Foi o caso de hoje, durante o intervalo para o almoço, enquanto esperava a esposa. Utilizei aquele breve período no shopping para colocar as leituras de minha dissertação de mestrado em Letras em dia, ou quase isso... Lendo o livro Elementos de Análise do Discurso, de José Luiz Fiorin, da USP (que tive o privilégio de assistir um curso seu ano passado sobre enunciado e enunciação, na PUC-RS, em Porto Alegre), deparei-me às p. 17-18, com o texto "Apólogo dos dois escudos", de José Júlio da Silva Ramos. E vejam só, focado para o mestrado, percebi um ótimo texto para motivação de professores sobre as questões envolvendo tecnologia e educação. Após o referido texto, que reproduzirei abaixo, comentarei e refletirei sobre o que ele me despertou.

Apólogo dos dois escudos

Conhecem o apólogo do escudo de ouro e de prata?
Eu lhe conto.
No tempo da cavalaria andante, dois cavaleiros armados de ponto em branco (= com cuidado, com esmero, completamente), tendo vindo de partes opostas, encontram-se numa encruzilhada em cujo vértice se via erecta uma estátua da Vitória, a qual empunhava numa das mãos uma lança, enquanto a outra segurava um escudo. Como tivessem estacado, cada um de seu lado, exclamaram ao mesmo tempo:
- Que rico escudo de ouro!
- Que rico escudo de prata!
- Como de prata? Não vê que é de ouro?
- Como de ouro? Não vê que é de prata?
- O cavaleiro cego.
- O cavaleiro é que não tem olhos.
Palavra puxa palavra, ei-los que arremetem um contra o outro, em cmbate singular, até caírem gravemente feridos.
Nisto passa um dervis, que depois de os pensar com toda a caridade, inquire deles o motivo da contenda.
- É que o cavaleiro afirma que aquele escudo é de ouro.
- É que o cavaleiro afirma que aquele escudo é de prata.
- Pois, meus irmãos, observou o darês, ambos tendes razão e nenhum a tendes. Todo esse sangue se teria poupado, se cada um de vós tivesse dado ao incômodo de passar um momento ao lado oposto. De ora em diante nunca mais entreis em pendência sem haverdes considerado todas as faces da questão!


Transpondo a análise literária para o ambiente da tecnologia educacional e da própria educação, podemos dizer que os dois cavaleiros dos escudos de ouro e de prata servem de metáfora a professores e alunos, cada qual com seu "escudo" e espada, vindos de reinos distantes um do outro.
Alunos que usam a tecnologia no seu dia-a-dia como extensão do próprio corpo, acostumados com jogos ultrasofisticados, de capa e espada ou não, reclamam de seus professores e sua didática. Professores, ainda com a capa e a espada do Magister Dixt (o mestre disse!), escudados em práticas tradicionalíssima, desde a Távola Redonda, ressentem-se de alunos que só querem usar mp3, celular, ipod, etc. na escola e até mesmo em sala de aula.
Para certos professores alunos são bárbaros, pelos usos e costumes; para certos alunos alguns professores são povos invasores de seu habitat.
Falta na vida real o tal daroês, que concilie os dois mundos, e que faz ver aos dois cavaleiros que ambos podem estar certos e errados, dependendo do ponto de vista. E que ao invés de partirem para o confronto, podem apenas dar uma volta cada um no mundo do outro, e assim perceber que um cavaleiro tinha o escudo por fora de ouro e por dentro de prata, e o outro, ao contrário. E que, portanto, vendo apenas o exterior e não a parte interior do escudo, ambos pensam mal um do outro.
Para isso, nós, especialistas em tecnologia educacional, multiplicadores de informática educativa, formadores de cursos de capacitação de professores com o uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs) no ambiente escolar, devemos agir de forma conciliadora, reflexiva, provocativa, fazendo ver tanto a professores como alunos o mundo de cada um. O jovem que concebe a tecnologia apenas como diversão, não tem o conhecimento das possibilidades educacionais da mesma; o professor, que pensa na prática educacional sem os recursos tecnológicos também precisa se integrar ao mundo de seus alunos, dominado por esses meios eletroeletrônicos. Baixar os escudos de ambos e cada qual transitar no mundo do outro, sem espada em punho, é um desafio mais complexo do que passar de fases num jogo em tempo real como Age of Empires, que simula batalhas históricas, em que o jogador vai usando de estratégias para sobreviver ao jogo. Será que o professor não precisa também de estratégias para motivar seu aluno? Será que ele não precisa dessas também para se automotivar continuamente? Será que professores e alunos são cavaleiros e adversários, um do outro? Será que não é mais fácil o cavaleiro arranjar um escudeiro para lhe auxiliar no desenvolvimento de projetos de ensino e pesquisa com a própria turma? Houve um tempo em que a espada era a lei. Mas os tempos mudaram e precisamos saber ver o outro lado da margem em que estamos com os pés fincados ao solo. Curiosamente, penso que a forma da Távola Redonda, do Rei Arthur, cuja a mesa não tinha cantos justamente para mostrar que perante Deus não existiam melhores nem piores, mas sim uma igualdade e fraternidade, é a melhor forma de dispor de cadeiras e mesas numa sala de aula, em que todos se enxergam, olho no olho, e que não precisam estar enfileirados na frente de um "sargentão". Como esse pequeno e interessantíssimo texto, pude realizar duas atividades distintas, que tiveram nesse breve momento sua intersecção, que são literatura e educação. Todo texto deve produzir um sentido, não apenas para o seu autor, mas principalmente para o leitor. No meu caso, o texto de José Júlio da Silva Ramos promoveu um duplo sentido. Que minha postagem possa também servir de motivação a outros educadores que vivenciam essa prática de dois escudos em seu cotidiano. Educação não é um jogo, mas em tempo real deve ser vivenciado, para a resolução de problemas e para a passagem de novas fases. Ai que está o papel do professor, articulador dos saberes: mostrar aos alunos que o conhecimento deve ser gradual, e que não devemos na vida real tentar copiar o password (senha, atalho pra outra fase), sem vivenciar por experimentação e erro ao que só o tempo real pode nos legar. Quando descobrimos com outros o cobiçado "segredo" de mudar de fase sem estudar, a vida mais adiante nos cobrará o conhecimento que saltamos e não aprendemos nem apreendemos conosco. Descobriremos que o segredo não é de ouro nem prata, mas de lata e que logo perde o valor... O verdadeiro segredo é querer aprender de forma compartilhada...
Observação: Imagem acima, relativa ao acima citado jogo Age of Empires, extraida da internet, do endereço
http://www.gameogre.com/reviewdirectory/reviews/
Age_of_Empires_2.php

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9 Comments:

Blogger Robson Freire said...

Olá Zé

Que maravilha de texto!!! Mas é assim mesmo alunos de um lado e professores do outro. O seu texto me lembra de uma passagem que vivenciei aqui por Itaperuna.

A escola onde está localizado o NTE de Itaperuna declarou guerra aos infames bonés. ISSO MESMO MEU AMIGO ... MORTE AOS BONÉS. Foi hilario os professores achavam uma "FALTA DE RESPEITO" o aluno ir para sala de boné. Aí entra este aqui e diz assim: " QUE BOM QUE ELE ESTÁ ASSISTINDO AULA DE BONÉ OU SERIA MELHOR ESTAR NA RUA SE DROGANDO SEM BONÉ?

Meu amigo as posições foram ao extremo mesmo, com abaixo assinado e tudo, ridículo. Mas felizmente o bom senso prevaleceu e os bonés estão de volta.

A historia acima foi somente para ilustrar o tão longe pode chegar a discussão.

Mas a pratica de aprendizagem colaborativa dá ao aluno uma dimensão do que é ser professor, pois ele é responsável pelo seu aprendizado e de seus pares. Em contrapartida os professores aprendem com eles.

O verdadeiro segredo de aprender de forma compartilhada eu tenho distribuído aos meus alunos e colegas quase que como remédio a cada 6 horas.

Parabéns pelo artigo maravilhoso e você tenha mais horas para ler e nos brindar com suas postagens brilhantes.

01:30  
Anonymous Anônimo said...

Senhor um apologo são com seres inanimados

09:26  
Blogger José Antonio Klaes Roig said...

Grato pela informação.

23:14  
Anonymous Anônimo said...

It's going to be ending of mine day, however before end I am reading this fantastic paragraph to improve my experience.

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Anonymous Anônimo said...

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Blogger tech said...

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16:27  
Blogger tech said...

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Blogger yanmaneee said...

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